Sobre “O Terceiro Prato – Notas sobre o Futuro da Alimentação” de Dan Barber
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sustentabilidade de um sistema agrícola, ditando
simultaneamente o potencial de sabor.
Trata-se, assim, de comer/cozinhar toda a explo-
ração agrícola da mesma forma que se deverá
comer/utilizar todo o animal, de comer aquilo que
a alimentação “industrial” nos foi desabituando de
comer e de alterar a arquitetura do prato. E não
será necessário reinventar a roda, mas apenas recu-
perar e tornar mais eficientes certos sistemas agrí-
colas tradicionais, que foram sendo abandonados
em nome de uma produtividade afinal enganosa.
O que Barber diz é que esta mudança na agricul-
tura tem de passar pela maneira como comemos.
O tipo de agricultura de que precisamos não pode
ser sustentável se as nossas dietas não utilizarem
toda a diversidade que ela oferece, nem se se man-
tiverem certas tendências atuais, de consumo cres-
cente de carne, por exemplo, ou ainda de utilização
de cereais como ração. É preciso incentivar as die-
tas que refletem o que um sistema agrícola susten-
tável oferece. É isso que o Terceiro Prato significa:
comer a paisagem.
Para Dan Barber, o futuro da alimentação, e a única
forma de alimentar um planeta com uma popula-
ção crescente, é apostar nesta agricultura diversifi-
cada e comuma visão global da exploração agrícola,
integrando a produção vegetal e animal com uma
gestão sustentável do solo. Este tipo de agricultura
não só é essencial do ponto de vista ambiental e
numa perspetiva de longo prazo, mas também per-
mite ultrapassar frequentemente a produtividade
de sistemas de monocultura que recorrem exclu-
sivamente a produtos químicos, muito comuns em
países como os Estados Unidos.
As fronteiras entre cozinheiro, agricultor e consu-
midor vão-se esbatendo à medida que se difunde
a ideia de que aquilo que comemos começa muito
antes de chegar à cozinha. O papel dos
chefs
e dos
consumidores será o de incentivarem os produtores
e os cientistas a produzirem comida saudável, “
ver-
dadeiramente deliciosa
” (uma expressão que Bar-
ber utiliza com frequência) e nutritiva. A tarefa de
otimizar o sabor, promover o ambiente e desenvol-
ver a economia é uma responsabilidade de todos.
“
A ciência ensina-nos que a resposta para compreen-
der a complexidade de alguma coisa é decompô-
-la nas suas componentes. À semelhança da cozi-
nha convencional, insiste que as coisas têm de ser
medidas e pesadas com precisão. Mas as interações
e as relações ( …), aquilo a que chamamos ecolo-
gia – não podem ser medidas nem pesadas
.” (p.20)
“
A nossa convicção de que podemos criar uma dieta
sustentável escolhendo a dedo os melhores ingre-
dientes está errada. Porque tem uma visão estreita
das coisas. Não podemos pensar em mudar partes
do sistema. Temos de pensar em redesenhar o sis-
tema
.” (p.21)
“
A atual cultura alimentar deu aos
chefs
uma plata-
forma de influência, incluindo o poder, senão o luxo,
de inovarem. Enquanto árbitros do gosto, podemos
ajudar a inspirar um Terceiro Prato, uma nova forma
de comer que junte todas as peças
.” (p.22)
Embora difícil, Barber adianta que a tarefa é intui-
tiva, porque “
como as histórias deste livro sugerem,
ela assume sempre a forma de comida deliciosa.
O sabor verdadeiramente fantástico – aquele que
nos deixa pura e simplesmente de queixo caído – é
uma lente poderosa para o mundo natural, porque
o sabor penetra através de coisas delicadas que não
conseguimos ver nem apreender. O sabor é um pro-
feta, um revelador do essencial. E pode ser um guia
na reinvenção do nosso sistema alimentar e das nos-
sas dietas desde a base
.” (p.22)
O livro está dividido em quatro partes, com uma
Introdução e um Epílogo:
•
Parte I – Solo – Ver com olhos de ver
, onde Bar-
ber faz uma breve história da agricultura e do solo
(e uma história do trigo) nos EUA, na segunda
metade do século XX, altura em que a produti-
vidades crescentes corresponderam problemas