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cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR

N.º 9

SETEMBRO 2017

42

mas e paisagens já não correspondentes – situação

comum mesmo em territórios com menor pressão

turística.

Dois aspetos são aqui relevantes numa estraté-

gia para o futuro. O primeiro, relacionado com o

eventual questionamento de ummodelo de desen-

volvimento que permitiu, nas últimas décadas, a

implementação de medi-

das de política agrícola e

de desenvolvimento rural

da União Europeia por

vezes pouco ajustadas às

prioridades nacionais e

locais. O segundo, decor-

rente parcialmente do pri-

meiro, relacionado com a

necessidade de (re)articu-

lar vínculos entre os siste-

mas agrários e os sistemas

alimentares locais onde

eventualmente se insere a

noção de fortalecimento das cadeias curtas. Con-

tudo, note-se que na noção de cadeia subsiste uma

insistência na especialização, na simplificação eco-

lógica que esteve e está na base do processo ero-

sivo já mencionado. Nesse sentido, para uma con-

sequente (re)invenção da

gastronomia, corresponde-

ria fazer uma (re)conexão

mais efetiva entre sistemas

e paisagens alimentares

tradicionais.

Isso não significa que não seja possível dispor no

país de um vasto património alimentar de base

territorial, cuja valorização se discute no contexto

da maior procura por produtos e serviços turísti-

cos associados com a (re)invenção da gastrono-

mia nacional. Pelo contrário. Portugal é talvez,

por diversas razões, um dos países europeus com

maior potencial nesse sentido. O elevado número

de produtos alimentares de qualidade diferenciada

é disso mesmo um sintoma.

Em função da estratégia montada para o efeito, isto

poderá talvez fazer-se mediante a intensificação

dos apoios intersetoriais para a agricultura fami-

liar, a reconversão (para a extensificação e diver-

sificação) de sistemas produtivos, a introdução de

novos indicadores para majoração de apoios dos

fundos comunitários ao investimento nas explo-

rações agrícolas; a maior transmissão de conhe-

cimentos intergeracionais,

a formação de jovens (e

menos jovens) em turismo

e culinária de base territo-

rial (algo pouco valorizado

no país) e a emergência e

(ou) consolidação de novas

formas participativas de

governança territorial.

A FAO pode dar um contri-

buto nesse domínio através

do programa de identifica-

ção e conservação dinâ-

mica de sistemas de património agrícola que foram

criados e mantidos por gerações de agricultores e

pastores com base em diversos recursos naturais

e práticas de gestão adaptadas localmente. Esses

sistemas refletem a evolução da humanidade, a

diversidade do seu conhe-

cimento e a sua profunda

relação com a natureza,

traduzindo-se numa mul-

tiplicidade de bens e ser-

viços relacionados com as

paisagens alimentares. Em Portugal, a região do

Barroso no norte do país é a primeira candidata e

outras poderão seguir-se.

Conclusão

Num país onde uma parte da população ainda não

valoriza os aspetos distintivos da sua identidade e

da sua cultura, o

Manifesto

dos

chefs

portugueses

e a importância por estes atribuída às nossas iden-

tidades alimentares terá, com certeza, uma reper-

A FAO pode dar um contributo nesse

domínio através do programa de

identificação e conservação dinâmica

de sistemas de património agrícola que

foram criados e mantidos por gerações

de agricultores e pastores com base em

diversos recursos naturais e práticas de

gestão adaptadas localmente.

Em Portugal, a região do Barroso no

norte do país é a primeira candidata e

outras poderão seguir-se.

… a gastronomia portuguesa não é

apenas uma herança identitária do

passado, mas uma variável-chave para o

futuro do país e seus territórios.