cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR
N.º 9
SETEMBRO 2017
18
se associam outras, as conhecidas ervas aromáti-
cas condimentares, espontâneas – como o orégão,
poejo, tomilho, alecrim e tantas outras – ou cultiva-
das, como são, por exemplo, o coentro, a hortelã e
outras que integram as tradições culinárias locais.
No Sul do país, estes recursos alimentares consti-
tuem um sinal distintivo da cozinha familiar, que
importa identificar, valorizar, em suma, patrimo-
nializar, para que não se percam nem os saberes
a eles associados, nem as espécies que lhes confe-
rem sabores específicos. Ainda mais, porque, sendo
a gastronomia parte integrante do património cul-
tural de um território, a sua interpretação e conhe-
cimento articulam-se com a história dos recursos
locais e da paisagem, os quais se assumem como
elementos-chave de valorização patrimonial e turís-
tica.
“O termo ‘património’ rela-
ciona-se,
entre
muitas
outras aceções, com algo
legado pelo passado, mais
ou menos ‘passado’, que se
quer conservar. Por sua vez,
patrimonializar,
significa
‘converter’ em património, construir ‘património’,
a partir de elementos pré-existentes, selecionados
entre outros que não se incluem neste processo”
(Contreras, 2007:18).
Contribuir para a patrimonialização destes recursos
alimentares, enquanto sinais distintivos da história
alimentar do mundo rural, significa, no nosso enten-
der, criar dispositivos que permitam não só conser-
vá-los, mas, sobretudo, utilizá-los e gerar dinâmi-
cas económicas de fixação das populações nestas
zonas.
No âmbito dos recursos locais e das práticas alimen-
tares tradicionais, os territórios do nosso país com
características mediterrânicas ocupam um lugar
de destaque nas motivações turísticas e apresen-
tam um potencial inestimável de recursos naturais,
nomeadamente, agroflorestais, bem como de sabe-
res tradicionais, que urge valorizar.
O modo alimentar mediterrânico recobre situações
tão diversificadas, que seria muito redutor defini-lo
genericamente para todas as zonas mediterrânicas,
com diferente história, embora com idênticas carac-
terísticas de flora e de fauna. O nosso país, que “é
mediterrânico
por natureza, atlântico por posição
”
5
,
constituiu, até há pouco tempo, uma das raras exce-
ções onde ainda se podia identificar este modelo,
com toda a sua riqueza de legados históricos, de
práticas seculares e de diversidade de produtos.
Geógrafos e historiadores consideraram que o Medi-
terrâneo se estende “até onde chegam as oliveiras”.
Ora a oliveira cultiva-se por todo o continente por-
tuguês. Assim sendo, a alimentação mediterrânica
seria praticada em todo
este espaço geográfico.
A cozinha mediterrânica
é conhecida como sendo
uma cozinha de aromas e
de verduras. A utilização
culinária de produtos hortí-
colas, nomeadamente de verduras em abundância,
e de ervas aromáticas condimentares, assim como
de um conjunto de recursos silvestres/agroflorestais
representa um dos aspetos emblemáticos das tra-
dições alimentares das zonas mediterrânicas, como
também, um dos seus princípios ou características
saudáveis. Neste contexto, as espécies silvestres
alimentares – particularmente ricas em nutrientes
essenciais, tais como sais minerais, vitaminas e áci-
dos gordos essenciais – são, atualmente, alvo de um
interesse crescente por “nichos de mercado” que
procuram conhecer verduras diferentes ou diversifi-
car a sua alimentação, experienciando sabores que
lhes são específicos. Para além de serem saudáveis,
dão cor e sabor aos pratos, o que justifica o entu-
5
Pequito, Rebelo (1929),
A Terra Portuguesa
, p. 55, citado
por O. Ribeiro,
op. cit.
, p. 39.
Contribuir para a patrimonialização
destes recursos alimentares significa
criar dispositivos que permitam não só
conservá-los, mas, sobretudo, utilizá-los
e gerar dinâmicas económicas de fixação
das populações nestas zonas.