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cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR

N.º 8

JUNHO 2017

66

é resultado, sobretudo, da perda ou alteração irre-

parável dos seus habitat

s.

Para se entender melhor o

commitment

da obser-

vação da natureza e da biodiversidade, resta ainda

referir que é muito difícil combater o efeito da dife-

rença de escala temporal entre vida humana e natu-

reza. A primeira decide-se e sente-se a curto prazo,

a segunda só é perfeitamente entendível a longo ou

muito longo prazo. Este facto determina um certo

egoísmo geracional que predomina na relação com

os valores naturais e a sua proteção.

Vêm estas palavras a propósito da importância crí-

tica de percebermos as coisas básicas que a natu-

reza significa, para que consigamos entender o que

é a sua conservação ou proteção e por que razão

esta é absolutamente relevante para a nossa pró-

pria, digamos assim, conservação e proteção.

É certo que os tempos mais recentes têm vindo a

desconstruir a ideia feita de uma certa dicotomia

entre homem e desenvolvimento humano, por um

lado, e conservação das espécies, da natureza e da

biodiversidade, por outro. Esta ideia, como sabe-

mos, enraíza-se fundamentalmente na dificuldade

de perceção da relação homem-natureza que ante-

riormente referimos, mas também, sejamos justos,

em inadequadas formas de comunicar por parte dos

defensores da conservação, muitos sem o conheci-

mento suficiente para reconhecerem a humildade

com que deve ser feita a abordagem desta magna

questão. A nossa capacidade de afirmação e conse-

quente possibilidade de obter sucesso nas causas ou

missões que percorremos está na relação inversa da

sobranceria com que “olhamos” os outros, as suas

motivações, constrangimentos ou dependências.

Contudo, esta noção de separação entre necessi-

dades humanas de desenvolvimento e constran-

gimentos causados pela natureza e sua conserva-

ção está longe de estar afastada e ainda condiciona

muito vastas áreas de decisão, desde a economia à

justiça, para não falar da política, onde, sempre que

se trava a “batalha” desenvolvimento-conservação,

quase sempre a perspetiva vencedora assenta na

convicção de que a satisfação das necessidades

humanas é prioritária, ainda que por vezes, ou mui-

tas vezes, estas sejam apenas irreais ou sirvam para

a remuneração de interesses de curto prazo.

A gestão da chamada política da conservação da

natureza é bem o exemplo desta perspetiva, ainda

que não assuma essa sua fragilidade ou mesmo

cumplicidade com interesses ou perspetivas contra

a conservação. Constrói-se num

portfólio

imenso

de tratados, leis, diretivas, estratégias e programas,

mas falha na maior parte dos casos quando tem

que optar pela aplicação dos compromissos assu-

midos ou acompanhar interesses económicos e

políticos conjunturais.

Recentes decisões de construção de determina-

dos empreendimentos, à

outrance

avaliados como

sendo de discutíveis impactos positivos de índole

económica ou até de promoção do chamado

desenvolvimento local, foram tomadas pelas auto-

ridades governativas da área do ambiente ainda

que na presença de pareceres técnicos (da própria

Administração Pública) com a demonstração das

consequências negativas para a preservação dos

sistemas naturais.

A mesma lógica de atitude se identifica quando o

financiamento público à conservação da natureza

é claramente preterido em função da promoção

de outras opções, algumas com reconhecido valor

ambiental, mas outras bastante discutíveis quando

se conhecem como destinatários as

performan-

tes

indústrias do ambiente. A afetação recente dos

recursos do Fundo Ambiental é uma boa demons-

tração do que dizemos.

É neste contexto de falta de perceção da interde-

pendência crítica entre as atividades humanas, com

maior ou menor perfil económico, e a conservação

e proteção da natureza, que se entende também,

embora não se subscreva nem se considere lógico e