cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR
N.º 8
JUNHO 2017
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plo, no caso da perda de serviços de polinização,
controlo biótico de pragas e doenças, e forneci-
mento de nutrientes pelo ecossistema solo. A prote-
ção destes serviços de ecossistemas usados como
inputs
produtivos na agricultura é fundamental para
o sucesso da intensificação de base ecológica, uma
estratégia de aumento de produção com menores
custos ecológicos e económicos (face ao aumento
do preço da energia e, portanto, dos
inputs
indus-
triais com mais elevada incorporação de energia).
Por outro lado, a maior
parte das dimensões da
biodiversidade, sejam elas
a diversidade de espécies
com valor de existência
para as pessoas, a diversi-
dade genética, muitos ser-
viços dos ecossistemas e
também a diversidade de conhecimentos locais
associados, por exemplo, aos agroecossistemas tra-
dicionais, têm características de bem público mais
ou menos puro. Por isso, são de esperar múltiplas
falhas de mercado na conservação da biodiversi-
dade, o que implica que os problemas de conser-
vação associados aos três planos acima referidos
requeiram também uma resposta em termos de
políticas públicas, ação de entidades representa-
tivas de interesses coletivos (associações agríco-
las ou ONGA) e não apenas individuais, bem como
uma concertação estratégica entre as diversas par-
tes interessadas.
Os três planos acima referidos e esta necessidade
de políticas estão bem refletidos nos diversos temas
abordados pelos artigos incluídos na secção “Gran-
des Tendências” deste volume da CULTIVAR. Fran-
cisco Moreira e Ângela Lomba sublinham a impor-
tância da gestão agrícola de baixa intensidade
produtiva na conservação da biodiversidade asso-
ciada às Áreas Agrícolas de Elevado Valor Natural na
Europa; neste contexto, abordam de modo crítico
a tese do
land sparing
(intensificação da produção
agrícola para deixar mais terra para a natureza), por-
que esta ignora a dependência de diversos elemen-
tos da biodiversidade face à gestão agrícola exten-
siva; propõem ainda uma abordagem baseada nos
sistemas agrícolas para informar a política de con-
servação. Cristina Branquinho
et al
. fala da relação
entre os serviços dos ecossistemas e a biodiversi-
dade que lhes subjaz, para depois se centrar num
caso de estudo da perceção da fileira do vinho, para
tentar compreender de que forma os serviços dos
ecossistemas se enquadram na agricultura “e como
podem ser promovidos por
via do conhecimento e ges-
tão da agrobiodiversidade”.
Teresa Pinto Correia subli-
nha a importância da abor-
dagem das relações entre
agricultura, biodiversidade
e serviços de ecossistemas
à escala da paisagem, per-
mitindo identificar uma diversidade de processos
em curso e de situações-tipos de paisagens dife-
rentes, que requerem respostas diferenciadas. Car-
los Aguiar e Ana Maria Carvalho discutem, por sua
vez, o tema da agricultura enquanto utilizadora de
recursos genéticos, os diversos graus de domesti-
cação envolvidos nesta utilização e o processo de
transição entre o agroecossistema orgânico tradi-
cional e o modelo industrial.
No resto deste artigo, abordamos as relações entre
sistemas agrários e conservação da diversidade
de espécies no contexto das Áreas Agrícolas de
Elevado Valor Natural (AAEVN), na Europa, distin-
guindo primeiro os padrões de relação entre agri-
cultura e biodiversidade, na Europa, do panorama
mais geral, a nível global. A forte associação entre
determinados modos extensivos de gestão agrícola
e áreas com elevada biodiversidade na Europa é,
em seguida, interpretada com base na hipótese do
nível intermédio de perturbação proposta por Con-
nell em 1978.
A nível global, a principal causa direta de perda de
biodiversidade reside na destruição de habitats pro-
… a perda de biodiversidade é também
uma perda de diversidade funcional,
da qual resultam ecossistemas locais
menos resilientes e menos capazes
de fornecer uma diversidade de serviços
de ecossistemas em proveito do
bem-estar humano.