Livro do Centenário do Ministério da Agricultura

A MEMÓRIA E OS TEMPOS // 49 // 76. As plantas, no verão, secam e perdem folhas. As chuvas ajudam os micro-organismos, do solo, e transformam matéria seca em húmus. 77. Cf. Os solos do Baixo-Alentejo. J.A.S. Varela – Ed. JCI - 1955. 78. Cf. A Agricultura portuguesa na PAC. Duas décadas de integração (1986-2006). J.A.S. Varela. Ed. Almedina. 2007. O que perfazia: 1,5 esc/kg. + 1,5 esc/kg = 3 esc/kg, como preço final a pagar. Assim, qualquer quantidade de trigo, vinda de onde viesse, de terras arroteadas ou não, passou de 1,50 esc/kg, para 3,00 esc/kg. Assim, todos ganhavam: Estado, Corporação da Lavoura, Federações dos Grémios da Lavoura, tanto do Alto como do Baixo Alentejo. Os solos, porém, derivados das rochas sedimentares da Era Primária, os xistos, é que, ano após ano, foram sendo erodidos. Terão sido todos estúpidos? Ou malfeitores, ou corruptos? Tal não foi o caso. O que aconteceu então? Aconteceram duas coisas lamentáveis. A primeira é que os solos pobres dos xistos (os matos, a charneca, no Alentejo) durante séculos (talvez milénios) não cultivados tinham-se enriquecido! Tanto a meteorologia como a biologia foram “fabricando” uma camada superficial, de matéria orgânica 76 . Assim, os primeiros sea- reiros, os que arrancaram matos e árvores (azinheiras), colheram 10, 15, até 20 vezes a quanti- dade de trigo que tinham semeado (cerca de 80 kg/ha). E foi a tal euforia, que até, como referi, se manifestou no ISA. E ninguém terá reparado que, ano após ano, a tal camada superficial, fértil, ia ficando cada vez mais delgada. Como o trigo é semeado no outono/inverno, e é também nesta estação do ano que há mais chuvas, no nosso clima, essas chuvas, caindo sobre terras ainda soltas e um pouco onduladas, foram erodindo os solos, levando-os rios e ribeiras abaixo, até ao mar… E houve uma fatura a pagar: no Baixo Alentejo, em 1955, já estavam degradados quase meio milhão de hectares de solos 77 . A segunda razão, ainda mais lamentável, é que, à medida que as produções caíam, mais terras eram arroteadas (cultivadas pela primeira vez). E, claro, as terras já arroteadas também conti- nuaram a ser cultivadas, continuando a erosão a levar os solos para o mar. Tal como o deus Moloch da lenda, que comia os próprios filhos, o trigo cultivado em solos fa- cilmente erodíveis, fez o mesmo. Aconteceu recentemente que, no baldio da Serra de Serpa e Mértola, uma pequena barragem na vertente para o Guadiana, devido a uma avaria de descarga de fundo, teve que ser esva- ziada, ficando o nateiro. A partir deste, e de mais outros dados, foi possível medir a erosão. Re- sultado: no decurso de 70 anos, dois milhões de toneladas de solos foram Guadiana abaixo, até ao mar… 78 Há aqui uma lição a tirar. No Ministério da Agricultura, devia haver um Serviço de Conser- vação dos Solos e da Água. Não tem! E faz falta…

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