Livro do Centenário do Ministério da Agricultura

OS TEMPOS DIFÍCEIS . 1910-1925 // 26 // Depois da cerimónia da Proclamação da República, já no decorrer da tarde, um grupo de ami- gos juntou-se no Nicola. Enquanto saboreavam o café, ou já beberricavam uma aguardente ve- lha, um pessimista voltou à cerimónia, naquela manhã, na Praça do Município. – Não sei se repararam que as palmas batidas na varanda não saíram de lá!… E até aquele Viva a República! Não fez vibrar a assistência… Mas logo outros justificaram: – Os militares, em formatura, não batem palmas… Nem dão Vivas! – Lá fora, na Praça, havia pouca gente… – O dia tem estado tão bonito!... 2. A POLÍTICA E AS HORTAS E era verdade: Os “alfacinhas” (os lisboetas) celebraram a República nas hortas… Naquela manhã de outubro, já em pleno outono, o tempo estava propício para fazer um piquenique, o que era muito do agrado dos “alfacinhas”. Nem sequer as praias da “linha”, Oeiras, Carcavelos, até Cascais, podiam competir com as hortas de Loures, as quintas de Belas, e até mesmo as de Carcavelos, com o seu vinho licoroso. “Domingo irei para as hortas na pessoa dos outros”, escreveu Fernando Pessoa, na “pessoa” de um dos seus heterónomos introspetivos (Álvaro de Campos). Ir para as hortas era, desde pelo menos, o final do século XIX, um hábito que estava entra- nhado na pele daqueles a quem, principalmente depois da Revolução de 17 de outubro de 1917, na Rússia, passaram a chamar, depreciativamente, os “burgueses”. Ora os de Lisboa, e desde que fizesse bom tempo, gostavam de passar o seu ócio dominical nas hortas da periferia de Lis- boa. O farnel era fácil de fazer e de transportar e, depois dos “comes e bebes”, uns estiravam- -se na relva, outros papagueavam, recorrendo a mais uns copos, enquanto os mais vigorosos bailavam. E assim, certamente, se passou aquele dia que começara com a esperança renascida pela pro- clamação da República. Infelizmente, porém, a tranquilidade e a serenidade, a alegria e os fol- guedos, não iriam durar muito. 3. É QUE NEM TUDO CORRIA MAL NO “REINO DA DINAMARCA” Naquele início auspicioso da 1.ª República, os conflitos e as tragédias que tinham vindo a aba- ter-se sobre Portugal pareciam terminados. Nem tudo, porém, fora negativo no passado.

RkJQdWJsaXNoZXIy NDU0OTkw