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cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR N.º 4 JUNHO 2016 40 são Europeia pretende, elas começarem a ser cul- tivadas também na União Europeia, os números só poderão acentuar-se marcadamente no sentido da “glifosatodependência”. Não será portanto coincidência que o teor máximo de resíduos de glifosato legalmente permitido tenha sido alargado sem qualquer base científica. A Comissão Europeia aumentou em 200 vezes a tole- rância na soja (passou de 0.1 para 20 mg de glifo- sato/kg) em 1999. Os primeiros transgénicos tinham sido autorizados na União Europeia em 1996. Glifosato enquanto sopa química A problemática traçada ganha densidade con- soante o nível de perigo do glifosato para a saúde e ambiente, mas a questão é mais abrangente do que se imagina. Se aplicarmos num terreno uma solução de 2% de sal de glifosato em água as plan- tas não morrem. Mas se aplicarmos um herbicida à base de glifosato, com a mesma concentração, as plantas já secam todas. O que é que mudou? No herbicida estão muitas outras substâncias químicas para além da substância ativa principal. Estes coad- juvantes por vezes são chamados inertes mas na verdade são altamente ativos e podem ser até mais tóxicos que o glifosato – 10 mil vezes mais tóxicos, nalguns casos. 8 No entanto quando se definem os limites legais de exposição ao glifosato só se estuda o glifosato propriamente dito, muito embora a população esteja exposta à sopa química presente na emba- lagem. Embora só o glifosato esteja identificado no rótulo (o resto é considerado segredo comercial) o impacto real pode ser significativamente superior ao estudado: muitas ordens de grandeza superior, se estivermos na presença de efeitos sinérgicos. 8 ( www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3955666) Desregulação hormonal e cancro Investigação já de 2016 9 veio mostrar que pelo menos alguns destes coadjuvantes causam desre- gulação hormonal. As substâncias que perturbam o equilíbrio endócrino podem aumentar a produ- ção ou a destruição de certas hormonas, imitar hor- monas, mandar as células morrer ou multiplicar- -se, etc, etc. As implicações podem ser dramáticas, mas nada disto foi tido em conta nos regimes legais europeus vigentes. Quanto ao atual texto da Comis- são propõe-se banir um único coadjuvante. Na verdade a desregulação hormonal é apenas um dos aspetos relevantes. Por exemplo Gasnier et al . 10 demonstraram que os herbicidas à base de glifo- sato também são tóxicos para células humanas a concentrações realistas do ponto de vista da expo- sição ambiental – sendo que os coadjuvantes eram a componente mais tóxica. Mas o que se sabe sobre os efeitos do glifosato por si só já é preocupante. Em 2015 a Organização Mun- dial de Saúde (OMS) classificou-o na categoria 2A, o que significa que está demonstrado que causa can- cro em animais de laboratório e que nas pessoas tudo indica que também causa, embora as infor- mações sejam mais limitadas. 11 Segundo a OMS o glifosato está relacionado em par- ticular com o linfoma não Hodgkin (LNH), um tipo de cancro do sangue que está a aumentar em Por- tugal. Muito embora não seja possível demonstrar que os casos deste cancro são devidos a uma par- ticular substância, é relevante que Portugal apre- sente, dos 41 países europeus para os quais a OMS sistematiza informação, uma taxa de mortalidade claramente superior à média da União Europeia: é o sétimo país europeu onde mais se morre de LNH e é 9 ( www.mdpi.com/1660-4601/13/3/264/htm) 10 ( www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0300483X0 9003047) 11 ( www.thelancet.com/journals/lanonc/article/PIIS1470- 2045(15)70134-8/abstract)

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