126 CADERNOS DE ANÁLISE E PROSPETIVA CULTIVAR N.º 31 AGOSTO 2024 – Sequeiro de produtos alimentares do Novo Mundo, como a batata. Para promover a produção intensiva de cereais, criou um sistema de propriedade privada na Rússia que viria a ter efeitos profundos sobre o futuro do império, confiscando-se terras onde o trigo pudesse ser cultivado. Os planos para a guerra imperial centravam-se também nos cereais e a política de crescimento com base no trigo viria a prosseguir durante mais de um século. Os ideais fisiocráticos moldaram também as perspetivas da colonização agrícola do Ocidente dos Estados Unidos, o investimento na educação e os planos para a exportação dos cereais, vindo a determinar os planos de independência. Na Europa, nos anos 30 e 40 do séc. IX, a alimentação dos camponeses baseava-se na batata e no centeio, enquanto o trigo que produziam era levado para os grandes centros urbanos, como Londres, Hamburgo, Viena, Moscovo, São Petersburgo e Istambul. Com o surgimento do P. Infestans5, a destruição de batatas e a perda de vidas humanas por via da fome e das doenças a ela associadas estenderam-se por toda a Europa entre 1845 e o início da década de 1850 – A Fome da Década de 1840. A resposta a longo prazo dos impérios continentais europeus à crise fez-se através da redução das barreiras tarifárias, dando lugar ao nascimento do comércio livre, numa série de tratados de comércio interligados. Tanto a Rússia imperial como os Estados Unidos desenvolveram a produção comunitária de cereais praticamente na mesma altura, mas as políticas de expansão foram distintas. Na década de 1850, a campanha russa de expansão para sul e a decisão de proibição da exportação de 5 Phytophthora infestans é um microrganismo semelhante a um fungo aquático, que causa a doença grave da batata e do tomate, conhecida como “requeima” 6 O biólogo Leigh Van Valen afirmou, em 1973, que a manutenção de espécies diferentes num ambiente variável só é possível quando há um esforço adaptativo contínuo. Esta hipótese recebeu o nome «Rainha Vermelha», a personagem do livro Alice do Outro Lado do Espelho, de Lewis Carroll, que, a dada altura, afirma que é preciso muito esforço para se manter a posição («It takes all the running you can do, to keep in the same place»). 7 O trigo-vermelho da Turquia (Turkey Red) foi, em tempos, a variedade dominante de trigo-vermelho duro de Inverno cultivado na região central dos EUA. 8 Trilhos de cereais cereais com a declaração de guerra contra a Turquia, a fim de assegurar a alimentação a baixo custo do exército e da marinha, desestabilizaram o até então invencível império agrícola. O aumento do preço do pão no Reino Unido e em grande parte da Europa Ocidental, levou a que em 1854 a Grã-Bretanha e a França se juntassem aos Otomanos contra o czar russo. Na década de 1860, verificou-se a dissolução da produção de trigo associada ao modelo de servidão e com o encurtamento das rotas comerciais, o progressivo fim do monopólio da Rússia sobre os cereais. Em contrapartida, a produtividade americana aumentou, em parte devido à utilização de maquinaria, tendo os produtores de trigo expandido a produção ao longo das planícies americanas a partir da replantação das sementes que vinham dos campos no extremo norte do Mar Negro, dotadas de propriedades únicas como a resistência à seca, ao frio e a fungos. Os cereais especializados que tinham evoluído em propriedades áridas no Mar Negro, adaptaram-se aos climas mais secos e frios do Alto Centro- -Oeste. “Sem a Rainha Vermelha6 e o trigo-vermelho da Turquia7, o trigo talvez nunca tivesse chegado ao Kansas ou ao Nebrasca”. Com a Guerra Civil Americana e a interdição da produção do algodão, a procura de uma nova cultura para as trocas internacionais, a fim de combater a recessão, levou a uma alteração dos trilhos de cereais em todo o mundo. O transporte de trigo de forma mais eficiente que os chumaki8 ucranianos, poderia transformar Chicago noutra Odessa. As evoluções no comércio de cereais americano derivaram de mudanças voláteis na procura europeia de trigo, combinadas com o problema da lentidão da informação.
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