Cultivar_3_Alimentação sustentável e saudávell

Intensificação sustentável: um novo modelo tecnológico na agricultura 15 intensificação agrícola do passado: o modelo quí- mico-mecânico. Trata-se de identificar os contornos da transição requerida do modelo químico-mecâ- nico para um novo modelo: a intensificação sus- tentável. Contudo, ultrapassar o dilema da intensificação requer mais do que uma mudança de modelo tec- nológico. Requer mudar o comportamento das pes- soas: produtores de bens alimentares, consumido- res e produtores de ciência e tecnologia; o que nos remete para o domínio das políticas públicas. A neces- sidade de novas políticas requer, por sua vez, que atuemos não só como con- sumidores, produtores ou cientistas, mas também como cidadãos que pedem novas políticas. Por isso, na secção final deste artigo, voltamo-nos para este tema da necessidade de novas políticas públicas para promover a inten- sificação sustentável. O modelo tecnológico químico-mecânico O modelo tecnológico em agricultura inclui não só a base de conhecimentos usada para gerar novas técnicas agrícolas para responder a novos desafios, mas também o modo como estas técnicas se articu- lam entre si para responder a estes desafios (Bonny e Daucé, 1989). Na Europa e na generalidade dos países mais desenvolvidos, no pós-Guerra, e, mais tarde, tam- bém em muitos países em desenvolvimento, difun- diu-se um novo modelo tecnológico na agricultura, num quadro caracterizado pela rápida diminui- ção da população ativa agrícola, absorvida pela expansão dos setores da indústria e dos serviços. A crescente escassez de força de trabalho e o con- sequente aumento do respetivo custo de oportu- nidade colocaram o aumento da produtividade do trabalho agrícola no centro do novo modelo tecno- lógico. A produtividade do trabalho na agricultura é o produto de duas componentes: a superfície cul- tivada por trabalhador e a produtividade por hec- tare de superfície cultivada. Assim, para aumentar a produtividade do trabalho, o novo modelo agiu sobre estas duas componentes com base numa dupla substituição: • de trabalho humano e tração animal por máqui- nas e motores, de modo a aumentar a superfície cultivada por trabalhador (componente mecâ- nica do modelo); • de processos biológicos que ocorrem no agroecos- sistema (e.g., fixação do azoto atmosférico pelas bactérias do solo, ou con- trolo de pragas por inte- rações bióticas) por inputs químicos de origem industrial (e.g., adubos azotados ou pesticidas), de modo a aumentar a produtividade por hec- tare de superfície cultivada (componente quí- mica do modelo). Devido à importância destas duas componentes do modelo, ele tem vindo a ser designado como modelo químico-mecânico (Bonny e Daucé, 1989). Ambas as componentes assentaram em sólidos avanços globais no domínio da ciência e da agro- nomia e no uso de enormes quantidades de ener- gia fóssil barata para produzir os inputs mecânicos (máquinas e combustíveis) e químicos (fertilizantes industriais e pesticidas) necessários. Como resul- tado, a agricultura tornou-se extremamente depen- dente deste subsídio energético: por exemplo, em Portugal, o consumo de energia fóssil necessário para produzir uma Kcal de energia alimentar mul- tiplicou-se por dez entre 1953 e 1989 – subindo de 0,17 para 1,70 kcal (Santos, 1996). As novas variedades de plantas melhoradas no âmbito do modelo químico-mecânico são, em geral, muito produtivas. Mas este potencial produtivo ape- Ultrapassar o dilema da intensificação implica assim produzir mais por hectare de superfície cultivada, sem para isso ter de aumentar a utilização de inputs por hectare, o que requer uma mudança de modelo tecnológico na agricultura.

RkJQdWJsaXNoZXIy NDU0OTkw