Cultivar_29

88 CADERNOS DE ANÁLISE E PROSPETIVA CULTIVAR N.º 29 DEZEMBRO 2023 – Indústria agroalimentar ancestrais, embora adaptadas às circunstâncias. Predominava o autoconsumo. Algumas bolsas de ”bem- -estar económico” podiam encontrar-se em parte da população das vilas ou, mais raramente, nas aldeias. 3. Governança O surto de investimento que se seguiu, durante os anos 60 e início dos anos 70, confunde-se totalmente com a evolução do CAICA, que representava sobretudo um plano de desenvolvimento agroindustrial, baseado numa infraestrutura do regime, os Grémios da Lavoura, a que foi adicionada uma rede de Cooperativas abrangendo todos os concelhos de Bragança e muitos de Vila Real. O embrião do empreendimento foi assim a Federação dos Grémios da Lavoura do Nordeste Trasmontano, FGLNT, que se formou a partir da associação dos grémios concelhios, os quais, individualmente, não tinham escala para mais do que a venda de alguns, poucos, fatores de produção. As cooperativas, dispersas, complementaram. A FGLNT era, assim, a cabeça da estrutura, que detinha o Complexo do Cachão, em Mirandela. Era o polo industrial onde se concentravam as unidades fabris que exigiam mais técnicos, mais investimento e necessitavam de uma economia de escala. Um polo secundário localizava-se na Cooperativa Agrícola de Macedo de Cavaleiros, distando 40 Km do Cachão onde, pela produção alargada, se justificava a implantação de mais unidades produtivas. Esta cooperativa agrícola data de 1961/62. As diferentes sedes de concelho do distrito de Bragança, e muitas do distrito de Vila Real, tinham também cooperativas adaptadas às suas realidades produtivas, em geral lagares de vinho e de azeite, armazéns de batata e de adubos e oficinas de máquinas agrícolas. As restantes produções destes concelhos eram canalizadas para o polo central, Cachão, onde eram calibradas, processadas, embaladas e comercializadas em conjunto. 2 A descrição pormenorizada da origem e vida do CAICA está extensamente desenvolvida na Biografia de Camilo de Mendonça. Tem um custo de 10€, mais portes, e pode ser encomendado para presidente.cercimac@gmail.com. As receitas revertem para uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS). 4. Camilo Mendonça2 É indispensável, ainda, associar a figura de Camilo de Mendonça, transmontano com raízes numa pequena aldeia do concelho de Alfândega da Fé, onde estudou e os seus pais viveram toda a vida. Após a instrução primária terminada, fez o ensino secundário no Porto e o curso de Agronomia no Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa. De personalidade magnética, brilho intelectual e capacidade de trabalho notáveis, associava ao estudo da agronomia diversas outras matérias. Desenvolveu conhecimentos sólidos na área da economia agrária, finanças, economia, sociologia, entre outros, que introduzia nos projetos que desenvolveu. Associava ainda a estes atributos uma ética pessoal de enorme exigência, não procurando benefícios materiais pelo seu trabalho. 4.1. Política Terminado o curso, enveredou entusiasticamente pela política, sendo deputado durante duas legislaturas seguidas (1953-1957 e 1957-1961), onde estabeleceu muitos contactos e praticou a arte da oratória e da feitura das leis. Nestes oito anos de política, na Assembleia Nacional (AN), teorizou o CAICA, sem ainda o saber, propondo soluções agroindustriais para a região de onde era oriundo. A meio da segunda legislatura, entendeu que os seus princípios éticos estavam a ser traídos e decide largar a política nacional, com grande estrondo, mudando radicalmente de vida, com a mudança para Trás-os-Montes. Meses antes havia sido convidado para a direção da FGLNT, que aceita de imediato. Corria então o ano de 1960. 4.2. Chamar a atenção Trás-os-Montes e os seus habitantes, tal como o estado sociocultural e económico da região, não eram novidade nenhuma: os notáveis locais viviam numa paz esquecida do progresso, longe dos cen-

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