cultivar_23REV

34 CADERNOS DE ANÁLISE E PROSPETIVA CULTIVAR N.º 23 AGOSTO 2021 agricultura e a promoção da função sumidouros dos sistemas naturais e das terras agrícolas e florestais. O Tribunal de Contas Europeu (TCE), num relatório especial lançado no passado dia 21 de junho 2 , faz uma avaliação bastante negativa do impacto da PAC 2014-2020 sobre a mitigação das alterações climáti- cas, tendo concluído que: 1. A PAC não reduziu as emis- sões dos animais; 2. As emissões de fertilizantes e aplicação de estrume nos solos estão a aumentar; 3. As medidas da PAC não levaram a um aumento generalizado do carbono armazenado nos solos e nas plantas; 4. As alterações na PAC 2014- 2020 não refletem a sua nova ambição climática. Com o enquadramento político da Lei Europeia do Clima, as conclusões do TCE são à partida obvia- mente preocupantes, porque sugerem que o setor agrícola poderá não estar a fazer a sua contribuição para a redução global de emissões que se pretende. Mas será que a análise da evolução dos totais de emissões do setor é suficiente para concluir se as medidas de política são ou não eficazes? A pergunta é pertinente, porque as emissões totais são ditadas não só pelo impacto da política agrícola, mas tam- bém por uma série de fatores exógenos a essa política, por exemplo: • Evolução dos preços dos fatores de produção e dos produtos finais; • Decisões individuais dos agricultores sobre que culturas agrícolas semear/plantar e que espé- cies e efetivos pecuários criar; • Impacto de desastres naturais, pragas, doenças e fogos; 2 https://www.eca.europa.eu/Lists/ECADocuments/SR21_16/SR_CAP-and-Climate_PT.pdf • Decisões e evolução do setor noutras regiões e/ ou fóruns (Organização Mundial de Comércio, evolução de mercados e produções agrícolas nos EUA, Brasil e América Latina, etc.). Para ilustrar a importância destes fatores, vejamos um exemplo de uma política de redução de emis- sões (muito simplificada e ape- nas para efeitos de ilustração). Imaginemos que é identificada uma tecnologia ou alteração de gestão que permite reduzir em 20% as emissões dos animais e que é desenhada uma medida de política para incentivar os agricultores a adotarem essa tecnologia ou alteração de ges- tão. Imaginemos também que existem atualmente 150 000 vacas “elegíveis” para aplicação dessa medida. Se todos os agri- cultores aderirem, e o número de vacas se mantiver, esperar- -se-ia, naturalmente, uma redução de 20% das emis- sões totais. Redução Esperada de Emissões Nº Vacas Fator de emissão tCO 2 eq./cb Emissões totais tCO 2 eq./ano Situação inicial 150 000 1,30 195 000 Situação final 150 000 1,04 156 000 Impacto -20,0% Mas a realidade será sempre distinta deste “desenho” origi- nal. Imaginemos que durante a vigência de política se con- segue de facto chegar a todos os agricultores e que amedida de política é realmente capaz de reduzir as emissões em 20% por vaca, mas que o contexto económico é tal que os agricultores aumentam o efetivo. O efeito combinado resulta num aumento de emissões, ape- sar de a medida de política ter sido 100% eficaz. É natural que o objetivo último das políticas climáticas seja o de redução das emissões em valor absoluto, incluindo nesse objetivo emissões da agricultura e a promoção da função sumidouros dos sistemas naturais e das terras agrícolas e florestais. …as conclusões do TCE sugerem que o setor agrícola poderá não estar a fazer a sua contribuição para a redução global de emissões que se pretende. ...as emissões totais são ditadas não só pelo impacto agrícola, mas também por uma série de fatores exógenos a essa política

RkJQdWJsaXNoZXIy NDU0OTkw