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58 CADERNOS DE ANÁLISE E PROSPETIVA CULTIVAR N.º 22 ABRIL 2021 pessoas eram muito mais profundos do que as esta- tísticas do PIB indicavam. E, se assim fosse, talvez os governos tivessem respondido mais vigorosamente para atenuar o impacto negativo da crise. Na verdade, medir o bem-estar não pode ser um fim em si mesmo. Para que os indicadores de bem-estar possam contribuir para melhorar a vida das pessoas, têm de ser usados na tomada de decisões pelos res- ponsáveis políticos e pelo público em geral. Embora cada vez mais países tenham assumido o desafio de desenvolver quadros de bem-estar, foram menos os que tomaram medidas para utilizar esses indicadores de forma mais sistemática nos seus cenários e decisões polí- ticas. Embora o desenvolvimento de uma melhor “bússola” ou de um novo “GPS” seja essencial para permitir um diagnóstico mais abrangente do estado de um país agora e no futuro, seria ingénuo pensar que os indicadores e estatísticas serão o único fator em jogo. Como observou J. M. Keynes: “ A dificuldade real emmudar qualquer empresa não está em desen- volver novas ideias, mas em escapar às antigas .” O que é necessário é um novo painel de indicadores de bem-estar, associado a uma nova abordagem à formulação de políticas que ofereça uma visão mais holística dos desafios políticos e crie mecanismos mais integrados para os enfrentar. Com base no relatório Stiglitz-Sen-Fitoussi de 2009 e no trabalho subsequente da OCDE e outros, no ano passado, o Grupo de Peritos de Alto Nível para a Medição do Desempenho Económico e do Progresso Social (HLEG, na sigla inglesa 3 ) publicou um relatório subli- nhando a necessidade de não só se procurarem melhorias adicionais na medição do bem-estar em diversas áreas (como a desigualdade de rendimento e de riqueza, a insegurança económica, a desigual- dade de oportunidades, o bem-estar subjetivo, a confiança, a sustentabilidade e a resiliência), mas também se ancorarem essas novas medidas em pro- cessos políticos que sobrevivam aos caprichos dos ciclos eleitorais. 3 High-Level Expert Group on the Measurement of Economic Performance and Social Progress O mundo enfrenta hoje profundos desafios. Embora, em alguns aspetos, o bem-estar tenha aumentado desde 2010, aomesmo tempo que o impacto da crise financeira continuou a fazer-se sentir em muitos paí- ses, incluindo Portugal, temos de fazer muito mais. Segundo o recém-publicado relatório da OCDE How’s Life 2020 , a redução das emissões de gases comefeito de estufa (GEE) no conjunto dos membros da orga- nização está longe de ser suficiente para atingir os objetivos em matéria de clima, enquanto em quase metade dos membros há mais espécies em risco de extinção. E quase dois terços das pessoas neste grupo de países estão expostas a níveis perigosos de poluição do ar. Em toda a OCDE, a vida con- tinua a ser financeiramente muito precária para um grande número de famílias, com quase 40% em risco de pobreza se tiverem de prescindir de três meses do seu rendimento e 21%, nos países europeus, referindo dificuldades em fazer face às despesas mensais. Ao mesmo tempo, as rápidas mudanças tecnológi- cas estão a transformar muitos aspetos de nossas vidas. A digitalização traz novas oportunidades, desde novos bens de consumo a novas maneiras de fazer negócios, mas implica também desafios significativos. O desenvolvimento de tecnologias de automação, sobretudo inteligência artificial, está a alterar não só o número como o tipo de empregos que as nossas economias geram e a maneira como estas estão organizadas, levando a preocupações generalizadas sobre o “futuro do trabalho”. Há tam- bém um crescente debate sobre o impacto que as novas tecnologias estão a ter na nossa qualidade de vida, desde a segurança informática à redução das interações familiares e ao aumento das perturbações mentais. Além disso, muitos países desenvolvidos estão a envelhecer muito rapidamente, levantando questões sobre a capacidade de as pessoas em idade ativa poderem sustentar populações em idade não ativa, e não apenas financeiramente: os idosos têm uma probabilidade quase três vezes maior em relação aos jovens de não disporem de apoio social, “A dificuldade real em mudar qualquer empresa não está em desenvolver novas ideias, mas em escapar às antigas.”
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