cultivar_22_Final_PT

Despovoamento em áreas rurais: entre a inevitabilidade e a capacidade de transformação 47 de incêndios florestais. É ver- dade que também parecem surgir novas oportunidades decorrentes da construção de uma nova relação ecolo- gia-comunidade-economia, como sucede com a valoriza- ção e o pagamento dos servi- ços dos ecossistemas ou com o estabelecimento de novas redes de produção-consumo alimentar mais orientadas por objetivos de segurança alimentar, sustentabilidade ambiental, justiça social e coesão territorial, e por isso mais enraizadas localmente em termos ecológicos e sociais. No entanto, a capa- cidade de os impactos destas frentes de inovação reverterem as tendências estruturais de perda demo- gráfica não é evidente. E não parece descabido ima- ginar que esses impactos poderão ser tão limitados quanto têm sido os efeitos das orientações patrimo- nialistas defendidas para as áreas rurais, assentes na certificação de produtos locais e no turismo da natu- reza, cultural e rural, ou as consequências da atração de neorurais, condições necessárias para mitigar o despovoamento das áreas rurais, mas insuficientes para o impedir e, por maioria de razão, para inverter as tendências prevalecentes. Entre a inevitabilidade e a transformação: que fazer? O debate sobre o despovoamento das áreas rurais, e em particular as do ´interior`, surge sistematica- mente associado a duas ideias: a do repovoamento do ´interior` e a da fixação das populações locais. Ambas as ideias são equívocas. A primeira, se tomada de forma generalizada, contém uma perigosa ilusão e uma mensagem política errada: a de que é possí- vel reverter a perda demográfica em todas as áreas rurais, ignorando-se irrealisticamente a diversidade estrutural das situações existentes. A segunda, se mal interpretada, surge como uma imposição que não só não toma em consideração o facto de o direito ao lugar (isto é, a permanecer na localidade ou município em que se vive) ser tão importante quanto o direito à mobilidade (ou seja, a procurar noutros locais, por vontade própria, as oportu- nidades pessoais, profissio- nais e familiares desejadas), como não leva em conta que o importante é dar condições para que cada cidadão possa escolher a sua opção prefe- rida, não sendo nem ´retido` nem ´expulso`. Claro que a rejeição do uso simplista das duas ideias refe- ridas no parágrafo anterior não pressupõe aceitar acriticamente o seu oposto: a inevitabilidade do despovoamento das áreas rurais e, como consequência, a desresponsabilização da intervenção pública porque inevitavelmente conde- nada ao fracasso; a inevitabilidade do encerramento de equipamentos e serviços de proximidade essen- ciais para a vida local com base em critérios de racio- nalidade económica e, consequentemente, a natura- lização da saída dos que vão deixando de encontrar resposta às suas necessidades ao nível local. Todos os documentos oficiais, tanto de organizações internacionais como nacionais, pugnam por áreas rurais mais resilientes, através, nomeadamente, da promoção do crescimento, da criação de emprego e da renovação geracional nas várias atividades aí desenvolvidas, em particular a agricultura. Mas estes desígnios gerais confrontam-se com a existência de realidades rurais diversificadas, como se exemplifi- cou anteriormente, e com capacidades muito desi- guais de adaptação à mudança e de transformação. Até que ponto podem então as políticas públicas combater o despovoamento dos espaços rurais? Para a questão colocada não existe uma resposta única e muito menos mágica, no sentido de garanti- damente bem-sucedida. Mas há opções que podem e devem ser tomadas: … uma mensagem política errada: a de que é possível reverter a perda demográfica em todas as áreas rurais, ignorando-se irrealisticamente a diversidade estrutural das situações existentes. … o direito ao lugar (isto é, a permanecer na localidade ou município em que se vive) é tão importante quanto o direito à mobilidade (ou seja, a procurar noutros locais, por vontade própria, as oportunidades pessoais, profissionais e familiares desejadas)

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