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Intensificação sustentável: um novo modelo tecnológico na agricultura 17 Contudo, ultrapassar o dilema da intensificação requer mais do que uma mudança de modelo tec- nológico. Requer mudar o comportamento das pessoas: produtores de bens alimentares, consumi- dores e produtores de ciência e tecnologia; o que nos remete para o domínio das políticas públicas. A necessidade de novas políticas requer, por sua vez, que atuemos não só como consumidores, produto- res ou cientistas, mas também como cidadãos que pedemnovas políticas. Por isso, na secção final deste artigo, voltamo-nos para este tema da necessidade de novas políticas públicas para promover a intensi- ficação sustentável. O modelo tecnológico químico-mecânico O modelo tecnológico em agricultura inclui não só a base de conhecimentos usada para gerar novas técnicas agrícolas para responder a novos desafios, mas também o modo como estas técnicas se articu- lam entre si para responder a estes desafios (Bonny e Daucé, 1989). Na Europa e na generalidade dos países mais desenvolvi- dos, no pós-Guerra, e, mais tarde, também em muitos países em desenvolvimento, difundiu-se um novo modelo tecnológico na agricultura, num quadro caracterizado pela rápida diminuição da população ativa agrícola, absorvida pela expansão dos setores da indústria e dos ser- viços. A crescente escassez de força de trabalho e o conse- quente aumento do respetivo custo de oportunidade colocaram o aumento da produtividade do trabalho agrícola no centro do novo modelo tecnológico. A produtividade do trabalho na agricultura é o produto de duas componentes: a superfície cultivada por tra- balhador e a produtividade por hectare de superfície cultivada. Assim, para aumentar a produtividade do trabalho, o novo modelo agiu sobre estas duas com- ponentes com base numa dupla substituição: • de trabalho humano e tração animal por máqui- nas e motores, de modo a aumentar a superfície cultivada por trabalhador (componente mecâ- nica do modelo); • de processos biológicos que ocorrem no agroe- cossistema (e.g., fixação do azoto atmosférico pelas bactérias do solo, ou controlo de pragas por interações bióticas) por inputs químicos de origem industrial (e.g., adubos azotados ou pes- ticidas), de modo a aumentar a produtividade por hectare de superfície cultivada (compo- nente química do modelo). Devido à importância destas duas componentes do modelo, ele tem vindo a ser designado comomodelo químico-mecânico (Bonny e Daucé, 1989). Ambas as componentes assentaram em sólidos avanços globais no domínio da ciência e da agronomia e no uso de enormes quantidades de energia fóssil barata para produzir os inputs mecâ- nicos (máquinas e combus- tíveis) e químicos (fertilizan- tes industriais e pesticidas) necessários. Como resul- tado, a agricultura tornou-se extremamente dependente deste subsídio energético: por exemplo, em Portugal, o consumo de energia fóssil necessário para produzir uma Kcal de energia alimentar multiplicou-se por dez entre 1953 e 1989 – subindo de 0,17 para 1,70 kcal (Santos, 1996). As novas variedades de plan- tas melhoradas no âmbito do modelo químico-mecânico são, em geral, muito produtivas. Mas este potencial produtivo apenas se manifesta quando estas plantas estão integradas em agroecossistemas profundamente modificados, em que encontram água e nutrientes em abundância e um ambiente asséptico em que pragas, doenças e outras plantas competidoras estão suprimidas pela utilização sistemática de pesticidas. Um número reduzido destas novas variedades de plantas alta- As novas variedades de plantas melhoradas no âmbito do modelo químico-mecânico são, em geral, muito produtivas. Mas este potencial produtivo apenas se manifesta quando estas plantas estão integradas em agroecossistemas profundamente modificados, em que encontram água e nutrientes em abundância e um ambiente asséptico em que pragas, doenças e outras plantas competidoras estão suprimidas pela utilização sistemática de pesticidas.

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