Cultivar_10_Trabalho na agricultura e as novas tendências laborais

cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR N.º 10 DEZEMBRO 2017 30 a produção passou, com frequência, a depender sobretudo da atividade de apenas um elemento. Os outros membros da família encaram a explora- ção como um património ou veem nela a possibili- dade de a utilizarem para lazer, férias ou residência. Esta situação tem vindo, nalguns casos, a propor- cionar um novo percurso às unidades familiares. Com a possibilidade crescente de recorrer a servi- ços exteriores para os trabalhos agrícolas, a execu- ção destes pela família, ou por um dos seus elemen- tos, deixa de ser marcante e a exploração familiar pode converter-se na exploração da família , aberta às diferentes solicitações dos seus vários membros. É uma adaptação certamente ainda de pouco vulto, que não se descortina na informação estatística, mas que configura uma nova relação com o património e o trabalho agrícola. O que os dados estatísticos mostram é que, hoje, 72% das explorações recorre a mão-de-obra não familiar (em 1980, a proporção era de 43%) e, no seu âmbito, cerca de 90% apela a tra- balhadores eventuais (60% por via da contratação de serviços a terceiros). E revelam também que o contributo das mulheres, que em 1980 se situava em pouco mais de 50% na medida do trabalho na agri- cultura do Continente, se fixa, na atualidade, abaixo do limiar de 45%; mingua também a sua prestação no segmento do trabalho assalariado (39% no fim dos anos de 1970, 31-33% no período subsequente até aos dias de hoje), persistindo, contudo, em redor dos 50% nos assalariados temporários. Expressiva foi a mudança na assunção das mulheres tituladas como produtores : no início da década de 1990, a sua quota fixava-se em 15%; em 2013, o nível supera os 30%. Note-se, ainda, no respeitante ao trabalho da população agrícola familiar, que, se no final dos anos de 1980, a participação do cônjuge e de outros membros da família se abeirava dos 55%, a partir de 2000 passou a ser o produtor a ter o desempe- nho fundamental do trabalho na exploração agrí- cola. Por sua vez, ao nível do tempo de trabalho na exploração – sob o pano de fundo, já referido, do regime a tempo parcial na agricultura – a mutação relevante ocorre com os outros membros da família: em 1990, a relação UTA/indivíduo cifrava-se em 0,35, em 2005, 0,25 e em 2013, a proporção de unidades de trabalho por cada pessoa do grupo “outros mem- bros da família” situava-se abaixo de 0,2. 4. Desde os anos sessenta, generalizou-se e, pro- gressivamente, intensificou-se o recurso à motome- canização e à energia elétrica, aos químicos agríco- las (adubos, fitofármacos, produtos para a sanidade animal, herbicidas), aos concentrados para a ali- mentação animal e a espé- cies melhoradas, vege- tais e animais. Destaque-se que, por 1980, se conta- vam, nas explorações agrí- colas do Continente, 62 300 tratores (estavam em 7% das explorações), em 1995, aquela contagem subia para 120 000 (em 30% das explorações) e, em 2013, para cerca de 136 000 (em 57% do universo de uni- dades agrícolas). Todavia, naquela primeira data já 53% das explorações utilizavam o trator que não lhes pertencia e dez anos depois tal quota ascendia a mais de 65%; em tempo seguinte, a fração aluguer de trator declina (40% em 2013): foi a mudança de sistemas produtivos, o incremento da motorização própria e da autonomização, e respetivo registo for- mal, das empresas prestadoras de serviços (os “ser- viços agrícolas” 2 ). O conjunto destas transformações tecnológicas foi comum aos países mais desenvolvi- dos, ainda que com ritmos e cronologias nem sem- pre coincidentes. Os sistemas de produção incorporaram estas tec- nologias e os resultados foram notórios. Aumentou 2 Na designação das Contas Económicas da Agricultura, CEA (INE). … a possibilidade crescente de recorrer a serviços exteriores para os trabalhos agrícolas… É uma adaptação certamente ainda de pouco vulto, que não se descortina na informação estatística, mas que configura uma nova relação com o património e o trabalho agrícola.

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