Cultivar_10_Trabalho na agricultura e as novas tendências laborais

cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR N.º 10 DEZEMBRO 2017 18 viria a afirmar-se como opinião predominante dos economistas políticos do século XIX, assim como dos economistas neoclássicos do século XX, cor- respondendo ainda hoje à posição ‘por defeito’ da maior parte dos economistas. Os economistas clássicos que defenderam a ideia de compensação e os seus herdeiros neoclássi- cos não negavam, nem negam, que a mecaniza- ção – seja à escala da empresa individual, seja à escala de um setor, ou mesmo de uma economia – possa ter como consequência a destruição de pos- tos de trabalho. Acreditam, no entanto, que estes efeitos se verificam apenas no curto prazo. Com mais ou menos sofisticação, argumentam que exis- tem outros efeitos que compensam a destruição de emprego verificada no curto prazo e que repõe os níveis de emprego no longo prazo. Estes efeitos de com- pensação incluiriam: a) o emprego envolvido na produção de máquinas; b) o reinvestimento pelos capitalistas das poupan- ças obtidas pela substitui- ção de trabalhadores por máquinas; c) a descida dos salários induzida pelo desemprego de curto prazo e a consequente reab- sorção dos desempregados a ‘custos salariais’ mais reduzidos; d) a descida dos preços de bens de con- sumo possibilitada pela mecanização e o decor- rente aumento do rendimento real e da procura; e) a criação de novos produtos e a decorrente geração de emprego na sua produção. 11 O desemprego tecnológico Em 1821, posteriormente à publicação do segundo artigo de McCulloch, Ricardo chegaria à conclusão 11 Piva, Mariacristina e Vivarelli, Março (2017), “Technolo- gical Change and Employment: Were Ricardo and Marx Right?”, IZA DP No. 10471, IZA – Institute of Labor Econo- mics. de que as doutrinas que havia apoiado a respeito das consequências da introdução de máquinas estavam erradas. Num novo capítulo introduzido na 3ª edição dos Princípios , criticava a ‘teoria da compensação’ para concluir que a “utilização das máquinas pode ser acompanhada de uma dimi- nuição da produção bruta [destinada ao paga- mento de salários] e, sempre que isso suceder, será prejudicial para a classe trabalhadora”, isto é, pode traduzir-se em desemprego e redução de salários 12 . A palavra pode na formulação de Ricardo é impor- tante, pois na realidade ele continuava a pensar, apesar de tudo, que existiam circunstâncias em que a destruição de emprego poderia ser compensada por novo investimento. Acreditava sobretudo que “[a] utilização de máquinas num país nunca deve deixar de ser incentivada pois, se não se permitir que o capi- tal proporcione o rendi- mento líquido máximo que as máquinas tornam possí- vel, ele sairá para o estran- geiro…”. 13 Na secção de O Capital dedicada à crítica da ‘teoria da compensação’, Marx louva Ricardo pela “impar- cialidade científica e o amor da verdade que lhe 12 Ricardo, David (1817), Princípios de Economia Política e de Tributação , 3ª edição (1821), Cap. XXXI, Lisboa: Fun- dação Gulbenkian, p. 454. Para escândalo de McCulloch, Ricardo concedia que “a opinião defendida pela classe trabalhadora de que a utilização de máquinas é frequen- temente prejudicial para os seus interesses não emana de preconceitos ou de ideias erradas, mas está de acordo com os corretos princípios da economia política” ( ibid. , p. 456). Em resposta epistolar a Ricardo, McCulloch escre- veria que se as novas do autor dos Princípios fossem cor- retas “as leis contra os Luditas são uma desgraça para a ordem jurídica britânica [Statute Book]” (citado em Sra- ffa, ibid. , p. lviii, nota 6). 13 Ricardo, ibid. , p. 461 A teoria da compensação… viria a afirmar-se como opinião predominante dos economistas políticos do século XIX, assim como dos economistas neoclássicos do século XX, correspondendo ainda hoje à posição ‘por defeito’ da maior parte dos economistas.

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